04 outubro 2005

Às vezes encontramos poemas que nos servem como luvas
Vestimo-los mesmo que limpando lágrimas
E olhando-nos ao espelho pensamos – que bem que me fica, vou mostrar-me assim aos meus amigos!
E sendo a beleza o esplendor da verdade (santo Agostinho) nunca as quis tanto como agora
O belo sentido nas formas nítidas do pensamento, suprema consolação!
O belo sentido nos olhos, nas embriagantes cores de todas as paisagens ou nos corpos e rostos de mulheres bonitas, e no sorriso eterno de um filho, de uma criança, de um velho, de um amigo!
O belo sentido ao compreendermos que o mal é sempre realizado por alguém que não está bem consigo próprio e que essa própria pessoa será mais bonita se esta beleza entender
Só esta verdade pode matar tudo o que é feio pois só o amor nos acalma a ira que nos assalta, e a ira é tão sómente uma defesa, arma instintiva que nos afasta de males exteriores e de fantasmas interiores criados por eles.
E esta verdade suprema, a das almas que brilham na beleza concedida em afinação constante, será para sempre bússola a poetas, artistas e a todos os que ousem cantar.

Às vezes encontramos poemas que nos servem como luvas
Sei que outro soneto chegará, talvez mais azul dentro de todo o azul dentro deste mosaico de contrastes que é a vida.

Um abraço


Rui



Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que para mim bastava amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram,
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa a que a fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos,
Oh, quem tanto pudesse que fartasse
Este meu duro génio de vinganças!


Camões

Sem comentários: