17 novembro 2007

A diferença está nas coordenadas

Do Brasil, Francisco G. de Amorim

Depois de ter passado algumas semanas lá pelas bandas do Norte - indo até 52° N e 0° O, o que pressupõe ter estado em cima do meridiano de Greenwich! - e algumas horas depois desembarcar em 23° S e 43° O, o choque é violento.


Não foi a primeira vez que isto me aconteceu e gostaria que não fosse a última, apesar de cada vez mais a preparação psicológica para enfrentar este choque se torna mais difícil.


Depois de ter visto um trânsito de milhões de carros que flui em perfeita ordem, em cima de ruas sem buracos, sem congestionamentos nem ultrapassagens de sinais vermelhos, onde todos os pontos de ônibus tem placas, iluminadas à noite, indicando para onde vão as diversas linhas que aí passam e seu impecável horário, onde a polícia ou o socorro aparece escassos minutos após serem solicitados, ainda alguns se atrevem a respirar de saudosismo das suas terras de além mar!

No regresso, à saída ao aeroporto, logo somos ultrapassados por um cabeça chata que em carro velho nos obriga a atirar o nosso para cima do passeio para evitar uma colisão, aos sinais de trânsito poucos são os que obedecem depois que o sol se põe (e até durante o dia!) e, quando ao fim de alguns quilômetros e largas centenas de buracos, mesmo nas vias principais, chegamos ao lar doce lar, logo as “alegres novidades” nos caiem como enxurrada em cima da cabeça: “Não se pode gastar muita água, porque desde há 3 semanas que estamos a comprar água de caminhões!”, “As duas linhas de telefones estão mudas desde ontem”, e “Não adianta quererem sentar-se em frente da Tv porque a Net está fora do ar desde manhã, e a ligação à Internet também não está a funcionar!”

Manhã seguinte, saudoso ainda daquelas altas latitudes norte e suas organizações, o jornal da manhã vem ajudar a desmoralização: “O gás vai aumentar 25%”, “Os policiais que foram presos por ligações com traficantes, voltam a ser soltos, soltam fogos de artifício e têm à sua espera carros de luxo para os levar”, “A BRA, companhia aérea, nova, com dois anos, anuncia de sopetão que vai fechar amanhã e já despediu todos os 1.100 funcionários”, etc.

Não leio mais o jornal. Deixo-me ficar quieto, nem sei se meditando com vontade de chorar, e nesse silêncio desorientado começo a ser consolado pelo canto dos sabiás, dos bem-te-vis, a sentir o “silvo” dos beija flores e suas asas batendo e os gritos das maritacas que passam em casais ou em bando, e até dos tucanos que pousam no alto das árvores que (ainda) circundam a nossa casa. A seguir chegam os pequeninos sagüis com os seus guinchos pedindo a banana que lhes é dada como “imposto” diário, e as latitudes norte começam a esfumar-se...

De qualquer modo a comparação é triste, porque poderíamos viver com um mínimo de ordem, desde que por aqui houvesse também um mínimo de interesse dos políticos e governantes.
Parece que estes não existem. São ausentes, e o país navega ao sabor das conveniências de momento. Será a diferença das coordenadas?

Que nos salvem os bem-te-vis e os sabiás!

11 nov. 07

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