03 agosto 2009

Eduardo Lourenço - "Tempo e Poesia"

A experiência do instante como alguma coisa que escapa ao tempo, que pertence ao eterno, ou melhor, algo que transcende tempo e eternidade - só o instante é real. Tempo e eternidade, passado e futuro esbatem-se no instante. O instante não tem história, nem projecto. O instante é inacessível a nós próprios, não se pode agarrar - agarrar é perdê-lo.

A saudade é esta ânsia de agarrar o inapreensível, o eminentemente fugaz. Inacessível e próxima. Enganam-se os que pretendem fazer da saudade algo de exclusivamente português. Existe sim, uma predisposição sensível para a apreensão da saudade.

Não podemos estar exilados de uma ideia de Paraíso, nós somos o Paraíso, portanto, não podemos sair de lá. Quanto mais procuro, mais me afasto. Não é na procura para fora, mas na procura para dentro que me devo buscar. A saudade é a reversão da própria busca.

Temos aqui uma Saudade tal como é definida por Pascoaes, mas fora de um espírito estritamente nacional. Só a experiência poética nos permite aceder a esta saudade ( e não a ciência, religião, filosofia...). A vitória real é a experiência poética. Na mais idealista das filosofias nós continuamos ainda prisioneiros do mundo. Só a forma poética é a libertação do mundo. Poesia é igual a Criação, anterior à experiência artística, ou à apreciação estética.

A experiência do tempo reduzido a um ponto só. Nós somos a grande imensidão.

(aulas de Filosofia em Portugal I, Prof. Paulo Borges)

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